sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Oração

Palavra é água
E penetra dizer
Mesmo no espaço de mínimos
Mesmo em três letras apenas
Cumprem destino
Chama:
Vem
Aceita:
Sim
Desejo:
Ser
Resume:
Nós
Despede:
Vai
Recusa:
Não
Lateja:
Dor
Confronta:
Sei
E definem:
Fim
Depois do fim o que há é a porta aberta da casa dos excessos
O vem, no vai. O não, do sim. A dor do sei. Os nós de ser.
Busca desesperada no outro pela permissão de trégua.
Paz.
E descobre altar
Enverga, e dobra até o mais rígido dos egos.
“Me deixe em paz”

É frase que nasce de joelhos.

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Primavera

"Você" é pronome-flor
A desabrochar
Poesia em mim.

Palavra, flor-aquarela

Errei mesmo o tom
Final de inverno,
Você já na primavera
à cores de distância
Nuances me confundindo
Cortinas
Essas palavras
Essas linhas soltas
Neblinas
Não se aventure a sentir em português
não é língua para amadores
Brinquei
Confiei na sintaxe
Ela não estava
Não me defendeu
E apanhei de todos os mercúrios do zodíaco
surra poliglota
Ainda assim não aprendi a calar, amor
É que amar é lei maior
Que eu, pelo menos.
Maiúscula
Em qualquer língua que vier
Sob a expectativa que sustenta
A necessidade caule
De cada linha-pétala silábica
Há solo de silêncio
E adubo de querer.
Então, perdão
É que a vida veio sem pauta
Sem margem
E se te escrevo em traço torto,
É pelo “C” das curvas
Do meu mundo

Coração. 

Perdidos

Caço o rumo
De arma em punho
Munição errada
tiro de festim
Ele foge
Vasto
No mundo dos meus exílios
Pra lá de Eu do norte
Depois de Eu do sul
Corta os polos
Brinca de me atravessar
Eu oriental
Eu ocidental
Pasto
Paro para respirar
Ele me olha de lá da frente
Pisca
Provoca
Pinta uma aquarela
Dança para me seduzir
Fecho os olhos
Tento recuperar o fôlego
Acalmar o acelerado do coração que quer continuar correndo
De tão cansado.
Troco armas.
Mudo o ritmo
Revejo o que fiz
Embaço a visão com uma lágrima atrevida que verto
Assinada: Frustração
Ele chega mais perto
Piedoso
Sorri, me limpa o rosto.
E me trás um espelho.

(Obrigada sempre Mirian Lipovetsky)

terça-feira, 23 de setembro de 2014

11:11

Atrasei palavras
Não sei saudar primavera
Sou alma do inverno
Fria? Nunca
Calor é necessidade.
Tal como camadas
Talvez seja esse o desafio
Penetrar camadas, chegar ao cerne.
Pode ser também o desagrado
Eu penetro camadas
De um outro, de alguém
A cada uma um universo
Desvendado?
Apresentado
Insaciável a busca
E o saber inquieta e quer
Mais saber.
Porém, é primavera
E o desabrochar das flores é
A lei?
É o que liberta
Eu me abro e declaro
Em desejo de pétalas
Uma a uma
Bem te quero.
Te quero o bem, e sem te olhar

Com quem. 
(Linhas feitas por inspiração de "Amanhecendo" na voz de Pedro Viáfora)

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Domingo

Fiz-te um samba
Canção
Manso
Rouco
Grave
Meio bossa
Despretensioso
Quase Los Hermanos.
Mas não achei refrão.
Nem consegui dizer muita coisa
Deixei em casa,
Amassado na folha de caderno
Rabiscado
Não publiquei
Não gravei
Nem sei se acabei
Não tem cara de coisa pronta
A melodia me acompanha
Dia todo na cabeça.
Cantarolando
Às tardes de domingo
Essa vontade me faz companhia
Compor virou necessidade
É dor
Expurga
Quase gozo
Como o mar se joga contra as pedras
Água esculpe
Muda forma
Minha Cura
Vem diminuir ausência
Esses hiatos
Vem me ajudar nessas dúvidas
Esse tédio
Essa fuga
Ouço-me e já não sou a mesma.
Nem esse lugar.
Só não responde perguntas cruciais
Por que você?
E será que importa?
Já deixou de ser?
Tempo sabe.

Eu não.
Mas o samba é pra você.

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Escambo

Troco
seu “depois” por uns acordes
Vem?!

Troco 
minha paciência por seu “fico”
Pensa?!

Troco 
suas ausências por um silêncio
A dois.

Troco 
seu travesseiro por meus braços
Deita?!

Troco 
o vazio da cama por mim mesma
Aqueça

Troco 
essa sua roupa por minha pele
Vista

Troco 
essa cegueira por seu olhar
Olhe

Troco 
minha razão por seu amor
Tente

E troco ter razão por ser amor
Quer?!

Troco amarelo por azul
Troco o azul por amarelo.

Troco 
o “para sempre” por “enquanto dure”
Versa.

Troco minhas metades por você

(Editado o formato em colaboração com Marcela Diniz)

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Ela.

Ela me pegou de frente
Me deu dois tapas seguidos na cara
“Para você acordar”, disse.
Segurou minha nuca
E me beijou.
Como se não houvesse nada mais a ser feito
Depois soltou abruptamente
Apagou a luz, me deixou no breu
Começou a brincar.
Me pegar de jeito
Me largar no chão
Me puxar e abraçar
Empurrar pra longe
Machucar, e acolher.
Socar minha barriga,
e me enfiar borboletas pelo estômago
À força.
Dançar comigo, e pisar no meu pé.
Desequilibrar.
Já estou rouca dela não me ouvir.
Não ensaio palavra ou apelo.
Me disse que se chama Vida, e que é assim mesmo.
Movimento.
Mas me avisou que adora meu sorriso.
E desde então, sempre que eu acordo, coloco ele no rosto.
E carrego no bolso uma razão ou duas para me ajudar nas quedas.
Sempre que ela o vê, me sorri de volta, e atenua a força dos golpes.
E em vez de flores, me manda algumas boas surpresas... 

quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Ensaio

Tenho passeado por ai
a tropeçar nas coincidências
A cada passo é essa sensação de "déjà vu"
Um susto e suspiro
No pensamento mais um clichê
“Lá vem de novo”
E tento desviar,
outro rumo
Porém a vida insiste a cada esquina
E vem essa ideia de que tudo antes foi só ensaio
Pra eu chegar até o dia em que te conheci
Músicas, cheiros, lugares
Os medos, os quase, as vontades.
me encurralam
Hoje foi a vez das cores
Vi a minha cor preferida 
parecer ter sido feita para você.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Retina

Não posso evitar
Lamento
E nem tentaria
Não quero.
Olho seus olhos e enxergo depois do seu olhar
Além da retina
Te vejo pelo poros
Te leio as entrelinhas
No tato.
E te respondo
Eu sempre mostro
Mesmo em silêncio, mesmo em hiatos
Mas você teria que olhar de volta.
E talvez se assuste
Não por verdades desvendadas
Mas pela nudez, que destrói as defesas.
Essa sua coragem atrevida.
Que me olha de cima dos ombros.
Segue viagem num mundo como se pudesse habita-lo só.
Talvez calçando um par ou dois de compreensão
E vestida de meia dúzia de rimas.
Eu também estou nua pra vc.
Minha compensação por invadir esses seus lugares íntimos.
Como um cisco no olho.
Nua pelos textos
Que escrevo, como se você os lesse.
Encontro ecos por ai que nem sabem o que me inspira.
E sim, o riso acha casa em meus lábios,
Mesmo nesse vazio
Mas por hora ainda te vejo.
Olho.
E você dança nesse lugar em que eu não existo.
E que eu não quero mais invadir.

Quero ser convidada a entrar.

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Rompante.

Ontem foi um susto.
Socou–me  o estômago, e me subiu na garganta
Por dentro
Amargo
Foram tantos os sustos desses dias
Esse sabor deixou de ser estranho
Mas não passou a bom
Golpes secos no meio do dia
Rompantes que aceleram o tempo
Quando volto a mim já perdi a tarde
Perdi o senso
Perdi o norte
Às vezes o sono, o sonho e o verso
O tempo.
Hoje já é sexta
Minha cabeça ainda pende.
Baixa, procura o passo ao lado.
A marca,
O pouso
Eu querendo...
Quando foi mesmo?

A última vez que seu sorriso me alegrou a retina?

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Paz e Silêncio

Há coisas que quando leio, te ouço dizer
Não sei se andam em mim
Fazem casa em você?

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Negligente, intransitiva.

Sou negligente com o amor
Amo música, mas meus cds não estão arrumados
Eu nem compro todos que quero,
Acho que os quero deixar livres
Nem o que tenho em meu computador está catalogado.
Ou obedece qualquer regra.
Minhas listas são exemplo de minha omissão
Cheias de vagas,
coisas que ainda quero, mas que deixo para depois
Às vezes até não querer mais.
Porém, quando ouço sou só entrega.
Ou um suspiro guardado no fundo, solto devagar.

Minhas próprias músicas estão por ai
Espalhadas em folhas de caderno
Escritas com uma letra corriqueira e mal tratada
Pela fluidez de meu pensamento que não permite zelo
Nas costas do violão.
Gravadas amadoramente,
Porém quando as toco, é com alma, pois as fiz de pedaços meus.

Meus livros estão espalhados pelo quarto, e pela vida.
Em outras casas alguns deles até encontraram outros donos
Mas meu amor é apegado, e eu ainda os chamo de meus.
Acho que o que eu tenho também me possui um pouco
Ou muito
Talvez inteiro

O que eu não sei é aprisionar o amor
Não sei catalogar,
Não sei colocar em listas.
Não sei colecionar.
Mesmo minhas ordens de prioridades não são comuns
Não aprendi a taxar o amor
Não aprendi a ter posse no amor
Não sei amar por contrato
Só por escolha
Por admiração
Não sei controlar e nem quero
Então se eu ficar quieta não é falta de amor
É só ele me pedindo o tempo de ser.
Se eu te deixar solta, não é falta de interesse
É ele me aconselhando a te deixar querer.
Se eu ficar em silêncio, não é por não querer te falar
É meu tempo de te ouvir.

Só sei amar assim,
Solta, inteira e intransitiva.